quinta-feira, 29 de março de 2018

Como tudo começou

A palavra investigada do momento, há cerca de um ano, era PROSPERIDADE. Fui convidada a ouvir sobre ela. Sobre sua relação com a troca, com o movimento, com a importância de fazer com que as energias circulem para que possa haver troca, colaboração, aprendizado e engrandecimento se a roda da fortuna girar positivamente. Sua gira ao contrário, entretanto, é o que traz a disputa, a inveja, o ódio e a desunião. E eu? O que eu preciso continuar aprendendo sobre isso?

Eis que o assunto Prosperidade me levou a Jung. Eis que Jung me levou ao Tarô Mitológico. Exatamente nesta ordem. Eis que, ao tentar decifrar as mensagens que as cartas traziam, uma cigana me surgiu na janela e começou a narrar as histórias que eu precisava conhecer.

Cartas tiradas em 28/3/2017


A Roda da Fortuna
A carta da Roda da Fortuna retrata três mulheres sentadas dentro de uma caverna escura. A primeira é jovem e tece em uma roca dourada. A segunda é elegante e madura, e mede o comprimento de um fio entre as suas mãos. A terceira é de mais idade e segura um par de tesouras. No centro, entre elas, há uma roda dourada ao redor da qual quatro figuras humanas são colocadas em posições diferentes. Pela abertura da caverna, um cenário com muito verde é visível.Aqui encontramos as três deusas do Destino que os gregos cha­mam de Moiras ou Parcas. Na Mitologia, as Moiras eram filhas da Mãe Noite, concebidas sem pai. Cloto fiava, Láquesis media e Atropos, cujo nome significa "aquela que não pode ser evitada", cortava. As três teciam o fio da vida humana na escuridão secreta da caverna e seus trabalhos não podiam ser desfeitos por deus algum, nem mesmo por Zeus. Uma vez que o destino de um indivíduo fosse tramado, ele seria irrevogável e não poderia ser alterado; e a extensão de vida e a época da morte fariam parte do destino que as Moiras estabeleces­sem. Se alguém tentasse desafiar o destino, tal como alguns heróis o fizeram, ele era afetado pelo que se chamava de "hubris" ou "hybris", que significa arrogância aos olhos dos deuses. É claro que esse indi­víduo não podia fugir ao seu destino e, às vezes, sofria um terrível castigo infligido pelos deuses por tentar superar os limites estabeleci­dos pelas Moiras. Dizem que certa vez Apolo, o deus-Sol, zombou e embriagou as Moiras para poder salvar da morte o seu amigo Admeto. Mas geralmente se acreditava que o próprio Zeus temia as donas do destino por não serem filhas de qualquer deus, mas a progénie das profundezas da Noite, o mais antigo poder do Universo.

No sentido interior, as três Moiras, detentoras da Roda da Fortu­na, apresentam a imagem de uma profunda e misteriosa lei agindo no indivíduo, desconhecida e ainda invisível, que parece precipitar re­pentinas mudanças e subverter os padrões estabelecidos da vida. As quatro figuras na Roda da Fortuna representam as diferentes expe­riências da jornada, pois, quando a vida age dessa maneira, no início não nos preocupamos em procurar a fonte por de trás da Roda, mas sim nossas reações à mudança. O homem no topo foi impulsionado para o sucesso pelo giro da Roda, enquanto o homem no fundo foi esmagado pelo que ele acredita ser "azar" - sem sorte alguma -, quando, na realidade foi a evidente ação de algum misterioso padrão. O homem à direita iniciou a sua subida, ajudado pelo mesmo poder invisível que coroou uma pessoa e derrubou outra; enquanto o ho­mem à esquerda, contra a sua vontade, iniciou a sua descida, pois a Roda girou e a sua "sorte" está se exaurindo.

Entretanto, a carta da Roda da Fortuna não diz respeito às mu­danças bruscas da sorte, do acaso ou por acidente. Atrás da Roda estão as Moiras que planejam de maneira inteligente e organizada as aparentes mudanças aleatórias da vida. Essas figuras antigas estão dentro de nós, bem no fundo do útero do inconsciente, e não fazem parte da personalidade consciente. Nós somente as percebemos por meio dos efeitos externos que parecem ser obra do Destino, mas que surgem das profundezas de nossa alma e não de um poder externo.

Na realidade, a experiência da Roda da Fortuna é a vivência da­quele "Outro" dentro de nós que, geralmente, projetamos no mundo exterior para poder culpar as pessoas, além de nós mesmos, pelas bruscas mudanças de sorte. O giro da Roda da Fortuna nos obriga a estarmos conscientes desse "Outro", o movimento inteligente que está por trás da Roda e que é o destino que todos temos dentro de nós mesmos. A imagem da própria Roda é profunda, pois seu aro giratório assemelha-se ao cenário em constante movimento com o qual nos deparamos durante a vida; porém o eixo está sempre no centro, uma essência ou fonte constante e imutável. O eixo é como o "eu" oculto que "escolhe" (apesar de não ser uma escolha do ego consciente) voltar-se para as várias situações, acontecimentos, ca­minhos e pessoas. O Destino não vem ao nosso encontro; ao contrá­rio, somos nós que nos dirigimos a ele. Na carta da Sacerdotisa, o Louco descobre a faculdade intuitiva dentro de si, personificada por Perséfone, que pode entrever o padrão em ação.

Na carta da Roda da Fortuna, o Louco encontra o poder que tece o padrão, a própria fonte de vida, distante e invisível, mais antigo do que os mais antigos deuses, com um domínio tão absoluto que nem sequer o rei dos deuses ousa desafiar. Até o espírito está sujeito aos comandos desse centro invisível que os gregos representaram com as Moiras e que desmantelam a nossa complacência e a nossa ilusão de controle.

É possível que a dificuldade e até o medo que algumas pessoas têm com respeito ao estudo do Tarô, da Astrologia* e de outras práticas proféticas sejam, em parte, devidos à ansiedade que surge quando a personalidade consciente, acostumada a tomar decisões e com a ilusão da vontade onipotente, confronta-se com esse "Outro" nas profundezas. Apesar de também nos pertencer, não está em nosso
poder controlá-lo, assim como Zeus temia as Moiras. Por conseguin­te, a Roda da Fortuna é mais do que um indicador de mudança. Ela é o emissário de uma profunda jornada interna pela qual o Louco, a nossa própria imagem, gradativamente chega a termos com o seu próprio destino.

No sentido divinatório, a Roda da Fortuna prevê uma mudança repentina da sorte. Isso pode ser tanto no sentido positivo quanto no negativo, mas, independentemente de como gira, ela sempre promo­ve o crescimento e uma nova fase da vida. Não podemos prever o que virá ao nosso encontro - ou melhor, qual será a transformação. Mas por trás dessas mudanças estão as Moiras, uma imagem do centro dentro de nós mesmos. Portanto, o Louco é despertado de sua acomodação e começa a descida para a sua própria fonte.


O Enforcado
A carta do Enforcado retrata um homem maduro, de cabelos e barba castanhos. Apesar de estar acorrentado em posição inverti­da, quase nu à beira de um precipício, ele ainda mantém uma expressão serena em seu rosto. Atrás dele, apresenta-se um cenário obscuro de rochas escarpadas, enquanto o Sol do crepúsculo reflete um brilho sanguíneo em seu corpo e ilumina a sua cabeça. Acima dele, uma águia se aproxima.

Aqui encontramos Prometeu, o Titã que desafiou a lei de Zeus roubando o fogo dos deuses para entregá-lo ao homem, que sabia muito bem que sofreria as consequências. O nome Prometeu signifi­ca "antevisão", e o Titã possuía o dom da profecia. Na Mitologia, também se dizia que ele criou o homem a partir da terra e da água de suas próprias lágrimas, enquanto Atena soprou vida na criatura. Prometeu tinha uma profunda compaixão pela sorte da humanidade por ele ser o seu criador.

Mas Zeus confirmava a sua divina supremacia sobre os homens ocultando-lhes o fogo. Isso significava a falta de progresso e de ilu­minação, pois sem o fogo o homem era condenado a viver como um animal, alimentando-se de carne crua e escondendo-se em caver­nas. Prometeu pegou um pouco do fogo sagrado da forja de Hefesto, escondeu-o no caule oco de um funcho e levou-o para a Terra.

Indignado com o roubo, Zeus resolveu exterminar a humanidade por meio de uma inundação a fim de destruir os culpados, pois ele não somente havia sido ferido em seu orgulho, mas com o fogo o homem poderia tentar tornar-se divino. Mas Prometeu advertiu seu filho Deucalião, que construiu uma arca e nela embarcou com sua esposa Pirra. A inundação durou nove dias e nove noites e no décimo dia o dilúvio cessou e Deucalião ofereceu sacrifício a Zeus. Tocado com sua piedade, o rei dos deuses concordou com o seu pedido de renovar a raça humana.

Mas Prometeu não teve a mesma sorte. Como havia previsto, Zeus prendeu-o com correntes indestrutíveis em um alto despenha­deiro nas montanhas do Cáucaso. Todos os dias uma águia descia das alturas para devorar o seu fígado, que a cada noite se refazia para que a tortura fosse mantida indefinidamente. Após trinta anos, Zeus permitiu que ele fosse resgatado por Héracles, que matou a águia e quebrou as correntes do prisioneiro. Prometeu tornou-se imortal e passou a usar um anel de um dos elos da corrente que o prendia como símbolo de seu cativeiro enquanto a grata humanidade erigia altares para honrar o seu benfeitor.

No sentido interior, Prometeu, o Enforcado, é o retrato do sacrifí­cio voluntário para um bem maior. O sacrifício pode ser representado por uma atitude externa ou interna, mas é realizado voluntariamente, aceitando o sofrimento que possa ser exigido. Na carta da Roda da Fortuna, o Louco depara-se com os bruscos golpes da sorte que provocam mudanças extremas na vida. Mas nós, tal como o Louco, podemos corresponder a essas mudanças de várias formas. Algumas pessoas não conseguem se adaptar e continuam agarrando-se ao passado. Outras se tornam amargas e culpam a vida, Deus, a sociedade ou qualquer outra pessoa. A figura de Prometeu é um símbolo da nossa parte que possui a percepção necessária para com­preender que essas mudanças podem ser úteis no desenrolar de um padrão interno que ainda não está claro. Por conseguinte, o Titã re­presenta uma atitude de submissão voluntária para com aquele cen­tro misterioso cujos padrões dependem dos giros da Roda.
Prometeu, o Enforcado, implica a aceitação da espera na escuri­dão. Ele está suspenso, torturado pela ansiedade e pelo medo de que o seu sacrifício possa ter sido em vão e, no entanto, mantém uma expressão serena. E, finalmente, a sua tortura o transforma, assim como o seu relacionamento com os deuses, pois o dom da imortalida­de lhe é concedido. De muitas formas, Prometeu abre mão do controle para que um novo e maior sentido de vida possa emergir. Como Prometeu criou o homem, pode-se dizer que ele mesmo também o fosse - uma espécie de espírito visionário dentro de nós que enxerga maiores possibilidades e está disposto a abandonar tudo o que anteri­ormente mantínhamos como sagrado para conseguir essa consciência maior. Como resultado, inicialmente Prometeu torna-se extremamente vulnerável, pois, se estivermos preparados a fazer esse sacrifício em confiança, então estaremos abertos para a vida, e ela poderá nos machucar. Mas o preço dessa entrega de defesas e a realização dessa jornada na solidão e na dúvida parecem ser necessárias para que tudo o que nos sustenta tenha um sentido real quando não puder­mos nos sustentar.

Isso é o que as religiões querem dizer com a verdadeira fé que somente pode ser adquirida por meio de nossas experiências na vida. A carta do Enforcado é um desabrochar natural da Roda da Fortuna, pois implica a disposição em confiar naquele "Outro" que sabe, me­lhor do que o ego, o que pode ser necessário e correto para o nosso desenvolvimento.

No sentido divinatório, Prometeu, o Enforcado, prevê a necessi­dade de um sacrifício voluntário com o propósito de adquirir algo de maior valor. Esse pode ser o sacrifício de algo externo que anteriormente proporcionou segurança, na esperança de que algum poten­cial possa ter espaço para o seu desenvolvimento. Ou pode ser o sacrifício de uma atitude preferida, como a superioridade intelectual, ou um ódio inesquecível ou uma busca insistente por uma fantasia inatingível. Dessa forma, o Louco responde ao desafio do giro da Roda com uma disposição em colocar a sua confiança nas tramas invisíveis do inconsciente e aguarda - muitas vezes com medo e ansiedade - na esperança de uma vida nova e melhor.


A Força
A carta da Força retrata um homem musculoso e poderoso com cabelos castanhos encaracolados, vestindo apenas uma tanga vermelha. Ele está embrenhado em uma luta selvagem com um leão envolvendo seus fortes braços no pescoço do animal; no momento crítico ele está vencendo a luta. Rodean­do os dois, as paredes rochosas de uma caverna escura. Pela entrada da caverna é possível ver um cenário árido de colinas
marrons.

Aqui encontramos o grande guerreiro Héracles chamado Hércules pelo romanos, que na Mitologia era o herói invencível. Ele era o filho de Zeus, rei dos deuses, com uma mortal chamada Alcmena, rei dos deuses, com uma mortal chamada Alcmena. A esposa de Zeus estava, como de costume, com ciúme da criança nascida do adultério do marido, dessa maneira o perseguiu com terríveis castigos. Ela fez com que ficasse louco e, em sua loucura, inadvertidamente assassinou a sua esposa e seus filhos. Héracles pediu aos deuses que lhe dessem alguma tarefa para expiar os seus crimes, e o oráculo de Delfos ordenou-lhe que se sujeitasse a 12 anos de trabalhos forçados a serviço do terrível rei Euristeus que Hera favorecia. E assim, o herói sujeitou-se voluntariamente a servir o favorito da deusa, que o perseguiu em reparação de um crime do qual ela era, definitivamente, a responsável.

O primeiro dos famosos Doze Trabalhos que o rei Euristeus exi­giu de Héracles era a conquista do Leão da Neméia, um enorme animal cuja pele era à prova de ferro, bronze e pedra. Como o leão havia despovoado a vizinhança, Héracles não pôde encontrar nin­guém que o dirigisse à sua toca. Finalmente, ele encontrou o animal lambuzado de sangue de sua última vítima. Héracles disparou uma série de flechas, que não conseguiam penetrar a sua grossa pele. Em seguida, usou a sua espada, que simplesmente acabou se dobrando; depois usou o seu bastão, que se despedaçou na cabeça do leão. Então Héracles cobriu uma das entradas da caverna em que o leão se escondia com uma rede e entrou na caverna pelo outro lado. O leão arrancou-lhe um dos dedos, mas Héracles conseguiu agarrá-lo pelo pescoço e o sufocou até a morte com suas próprias mãos. Ele então lhe cortou a pele com uma de suas e afiadas garras e passou a usá-la sempre como armadura e a cabeça como elmo, tornando-se tão invencível quanto o próprio leão.

No sentido interior, Héracles lutando com o Leão da Neméia é a imagem do problema em conter o poderoso e selvagem animal den­tro de nós, preservando, ao mesmo tempo, as qualidades animais que são criativas e vitais. O leão é um tipo especial de animal e reflete um aspecto diferente da psique humana, quando o comparamos aos cavalos fogosos da carta do Carro. Na Mitologia, o leão sempre foi associado com a realeza, mesmo quando está em seu estado mais destrutivo, e esse rei dos animais é, ainda, a imagem de um início infantil, selvagem e totalmente egocêntrico de uma especial individualidade. Portanto, o Leão da Neméia não é totalmente mau e possui uma pele mágica que pode oferecer invencibilidade. Essa invencibilidade está ligada ao sentido de permanência interior que procede de um sólido sentido do "eu". Quando vestimos a pele do leão que conquistamos, as opiniões das outras pessoas - os grandes "Eles" que amedrontam os corações dos tímidos - pouco significam, pois estamos armados com o nosso próprio sentido indestrutível de identidade.

Por mais prometedor que seja o seu potencial, o leão é selvagem e cruel em sua forma animal. Esse lado de uma pessoa descontrola­da é o impulso do "eu primeiro" que, sem pensar duas vezes, destrói qualquer um ou qualquer coisa em seu caminho, desde que a sua gra­tificação seja assegurada. A raiva é uma das manifestações desse impulso - não uma raiva sadia que seria apropriada para a situação, mas explosiva e furiosa quando não conseguimos o nosso intento. O orgulho implacável é outra de suas facetas - não o auto-respeito, mas uma bombástica e inchada auto-importância que pode nos tornar sel­vagens e rígidos com aqueles dos quais dependemos ou que nos rou­bam o centro das atenções. De muitas formas, o leão, como a crian­ça irada em nós, exige que o mundo esteja à nossa volta, destruindo cega e aleatoriamente quando isso não acontece. Mas, se esse ani­mal for conquistado, então podemos apropriar-nos de sua pele mági­ca que, em termos psicológicos, significa integrar o poder vital da besta, fazendo com que sirva a um ego consciente e responsável. Por conseguinte, a conquista do leão não é verdadeiramente uma morte, mas uma espécie de transformação, de maneira que a força e a determinação do animal sejam expressas por um humano, e não por um animal. Aqui está a ambivalência da carta da Força, pois Héracles poderia simplesmente destruir o animal sem que qualquer benefício fosse extraído do massacre. Essa é a faceta negativa de Héracles dentro de nós: o tipo de força que reprime todo instinto sem qualquer transformação, deixando para trás uma concha dentro da qual vive uma alma sem paixão, sem ira e sem uma verdadeira identidade.

No sentido divinatório, quando a carta da Força aparece em uma abertura de cartas, ela implica uma situação na qual um embate com o leão interior é inevitável, sendo necessário o controle da raiva e do orgulho insensato. Coragem, força e autodisciplina são solicitadas para enfrentar a situação. Por meio dessa experiência podemos en­trar em contato com o animal, mas também com uma parte nossa que é representada por Héracles, o herói que pode domá-la. Portan­to, tendo desenvolvido as faculdades da mente e o sentimento, o Louco agora aprende a lidar com o seu próprio exclusivismo, surgin­do desse encontro com confiança em si e integridade para com o próximo.


O Dois de Ouros
A carta Dois de Ouros retrata Dédalo, um homem moreno, de cabelos castanhos e vestindo uma túnica ocre e um avental de couro, em sua oficina. À sua frente, a sua mesa de trabalho sobre dois pentáculos dourados. Em ambos os lados, em uma treliça de maneira, uma vinha cheia de cachos de uva. Atrás dele, um cenário de ricas colinas verdes. Em sua mão esquerda, Dédalo segura o machado que acabou de inventar e, em sua mão direita, uma serra, também invenção sua.

A imagem do Dois de Ouros retrata Dédalo em início de carreira, quando desenvolve as suas habilidades e cria a sua reputação entre os atenienses, aplicando a sua engenhosidade em novas invenções, investindo seus esforços em novos projetos e mantendo-se ocupado e ativo, trabalhando em várias coisas ao mesmo tempo. A figura apresenta um homem materialmente ambicioso que ainda é aberto a novas idéias criativas e disposto a assumir riscos para poder pôr em prática os seus talentos. Entretanto, essa flexibilidade pode desaparecer bruscamente ao ficarmos presos a uma estrutura de su¬cesso que conseguimos angariar; mas ela sempre estará presente no início e, quando o Dois de Ouros aparecer, poderá ser recuperada.

Portanto, o Dois de Ouros representa o estado de mudança ou de oscilação dos bens materiais. Essa flutuação não implica prejuízos, mas um fluxo de energia criativa dirigida a vários projetos. Aqui, o poder primordial do Ás de Ouros foi polarizado como em todos os Dois dos Arcanos Menores, e o impulso para a criação material deve ser fundamentado e canalizado.

O conhecido dito popular "dinheiro faz dinheiro" é bem apropriado para essa carta, pois é necessário assumir riscos e usar o capital para que ele trabalhe e produza antes da realização dos lucros. O Dois de Ouros exige flexibilidade e disposição para fazer dinheiro e energia trabalharem, e muitas vezes isso significa manipular e movimentar os recursos de uma maneira que, para o indivíduo inexperiente, isso possa parecer um risco desnecessário que provoca ansiedade. Entretanto, a carta do Dois de Ouros pode ser interpretada como "boa", pois, apesar de sugerir a necessidade de prudência nos assuntos financeiros, ela promete recompensas, porque a energia criativa está devidamente trabalhada e movimentada.

No sentido divinatório, o Dois de Ouros anuncia o momento em que dinheiro e a força motivadora podem ser disponibilizados em novos projetos que podem levar a um futuro compensador. Mas o indivíduo deve estar disposto em fazer trabalhar os recursos assumindo riscos e fazendo uso do capital, em vez de pensar em economizar justamente quando as novas oportunidades estão surgindo. Por conseguinte, a carta do Dois de Ouros pode ser favorável para aqueles que sabem lidar com o dinheiro.


O Dez de Copas
A carta Dez de Copas retrata a elevação de Psique ao nível divino para que ela possa entrar no mundo dos deuses com o seu marido. O casal, de mãos dadas, encontra-se-novamente no esplêndido palácio de Eros. Psique não porta mais o seu traje virginal; a sua veste agora é de ouro cintilante e, sobre seus ombros, como o seu marido, um par de asas douradas. A frente deles, dez taças douradas.

O Dez de Copas representa um estado de permanência e de contentamento constante. O êxtase da reunião dos amantes na carta Nove de Copas não foi dissipado como na comemoração da carta Três de Copas e o descontentamento no Quatro de Copas, pois esse casamento se baseia na união consciente de dois amantes, mas par­ceiros diferentes. Por conseguinte, eles poderão usufruir um futuro que suportará qualquer desafio da vida ou dos deuses.

O fato de Psique ter sido elevada ao status imortal implica que, agora, o seu amor por Eros engloba não somente uma dimensão pessoal e sensual, mas também uma dimensão espiritual. Eros foi humanizado pelo seu amor por Psique; ele não precisa mais escon­der dela o seu rosto. Por outro lado, Psique experimenta um sentido de ligação com o divino que somente o amor profundo pode promo­ver. Dizem que, às vezes, o amor por uma pessoa abre o coração para o amor à própria vida; a vida tem significado e propósito, e um mundo mais amplo e mais brilhante descortina-se ao nosso olhar. Certa vez, Platão escreveu: "Quando olhamos para o rosto do ser amado, podemos ver o reflexo do deus que chegamos a venerar". É como se o amor, ao passar por muitas provas e fundamentado na honestidade e na humildade, nos ligasse às nossas próprias almas e com um sentido de permanência, significado e retidão na vida. Essa é a promessa inerente ao Ás de Copas que se realiza no Dez de Copas. Nem todo relacionamento consegue esse feito, assim como não o consegue sempre. Entretanto, nós humanos sempre tentamos.

No sentido divinatório, o Dez de Copas prevê contentamento e permanência duradouros no domínio do coração.


O Rei de Espadas
A carta do Rei de Espadas retrata um homem elegante, com feições bem definidas, barba e cabelos louros, vestindo uma túnica cinza e portando uma coroa dourada. Ele está sentado em um trono de prata em cujos braços está entalhado o emblema da harmonia perfeita, o triângulo equilátero. Em uma das mãos, ele segura uma espada e, na outra, uma balança.Atrás dele, um cenário de picos de montanhas embaixo de um céu com nuvens cinza.

Na carta do Rei de Espadas, deparamo-nos com a dimensão di­nâmica, iniciadora e organizadora do elemento Ar. Isso é encenado pela figura mitológica do herói Ulisses, chamado "o Astuto" e com o qual nos encontramos brevemente na carta da Rainha de Paus dos Arcanos Menores, como marido de Penélope. Ulisses, rei de Ítaca, nasceu pela união secreta de Sísifo com a filha do ladrão Autólicos, do qual herdou parte de sua astúcia e inteligência. Ao ser deflagrada a Guerra de Tróia, Ulisses juntou-se aos outros príncipes gregos no assalto a cidade.

Ele provou ser, vez e outra, um conselheiro perspi­caz e um bom estrategista. Foi Ulisses quem primeiro concebeu a ideia do Cavalo de Tróia, aquele cavalo gigante de madeira e oco, enviado para a cidade como presente da deusa Atena, escondendo dentro de seu bojo um destacamento de soldados gregos. Quando finalmente Tróia foi saqueada, Ulisses sempre mostrou ser magnâni­mo com os prisioneiros, prometendo que seriam tratados com justiça, caso se rendessem pacificamente.

Apesar de seus sucessos durante essa guerra, Ulisses não teve muita sorte em seu regresso para Ítaca. Durante dez anos, ele e seus companheiros foram forçados a vagar, levados pelos ventos e enfrentando adversários estranhos e perigosos no decorrer do percur­so e nas terras que visitaram.

Dentre esses lugares, havia a ilha dos Comedores de Lótus, onde os seus homens foram drogados e perde­ram a memória; a ilha dos Ciclopes, onde os ferozes gigantes de um olho só, filhos do deus ferreiro Hefesto, ameaçaram matá-los; e a Ilha da Aurora, terra da feiticeira Circe, onde os seus homens foram transformados em porcos. Ele teve de conduzir o seu navio entre os terríveis monstros marinhos Cila e Caribdes e escapar das sereias que matavam os marinheiros com o seu canto.

Ao longo de todas essas provas, ele agiu com previsão, inteligência, estratégia e astú­cia, impelido pela sua determinação de alcançar o seu lar, apesar das oportunidades de amor, riqueza e poder que se apresentaram duran­te essa sua viagem.

Ulisses, o Rei de Espadas, é a imagem das mais impressionantes habilidades estratégicas da mente humana. De todos os heróis da mitologia grega, Ulisses é o mais brilhante e o mais criativo, apesar de nem sempre ser honesto, pois seus dons intelectuais o tornaram o mais talentoso dos mentirosos. Mas a sua astúcia não era maliciosa, ele sempre a usava a serviço dos princípios que tinha como sagrados - o triunfo sobre os troianos e a santidade de sua terra natal, sua esposa c seu filho Telêmaco. O Rei de Espadas é um homem de princípios, mesmo que às vezes não coincidissem com os dos ho­mens em geral. Ulisses fez muitos inimigos pois, muitas vezes, os seus princípios não condiziam com a situação que ele enfrentava com seus companheiros.

A figura do Rei de Espadas tem altos ideais sobre a decência, a bondade e a imparcialidade, e o seu comportamento para com os troianos derrotados reflete bem esses princípios. Mas a sua bondade era fria e não decorria de uma verdadeira resposta emocional adqui­rida. Muitas mulheres se apaixonaram por ele, mas a sua única ma­neira de correspondê-las era sexualmente. Portanto, ele nos chega por meio da Mitologia como um brilhante estrategista, um negociante inteligente e manipulador, um homem bom com altos ideais e uma figura fria sem qualquer empatia real por outros indivíduos. Ulisses é a imagem do viandante, não no sentido do Cavaleiro de Espadas que sai em busca de aventuras, mas no sentido de que ele não está arrai­gado ao coração c, portanto, não está arraigado ao relacionamento com outras pessoas. Suas andanças podem ser interpretadas como uma espécie de homem sem teto, uma falta de ligação que é mais do que compensada por sua decência e inteligência, mas que o isola de seus companheiros e decepciona aqueles que o amam.

O Rei de Espadas incorpora a qualidade de liderança intelectual que é atraente e dinâmica no mundo. A sua ambivalência está em sua tendência à dissociação do sentimento que pode fazer com que pareça um tanto superficial c indigno de confiança. Sem dúvida ele é um homem de altos ideais e, no entanto, também é uma pessoa instá­vel que muda de aliança de acordo com os humores da situação para poder preservar a diplomacia e a cooperação. Apesar de contraditó­rio, em termos, os dois aspectos - de nobreza e de astúcia - da sua natureza surgem da mesma raiz idealista.

No sentido divinatório, quando o Rei de Espadas aparece em uma abertura de cartas, ele anuncia que chegou o momento de encontrar em nós mesmos o dom ambivalente da liderança intelectual e da estratégia. A proeza intelectual e as ideias inspiradas sobre como desenvolvê-las no futuro são qualidades que ele possui em abundân­cia. Algumas vezes essa figura pode aparecer na vida das pessoas na forma de um indivíduo notável, graças aos seus dons mentais e a sua capacidade de promover mudanças no mundo. Mas, se esse indivíduo entrar em nosso ambiente, ele pode ser visto como um ca­talisador por meio do qual podemos entrar em contato com essa di­mensão de nós mesmos.


O Seis de Ouros
A carta Seis de Ouros retrata Dédalo respeitosamente ajoelhado, suas mãos cruzadas em um gesto de súplica. A sua frente, sentado em um trono dourado está o rei Minos de Creta - um homem maduro de barba e cabelos pretos e tez morena, vestido em púrpura real e portando uma coroa dourada. Em suas mãos, o rei segura seis pentáculos dourados, que oferece a Dédalo em sinal de futuro apadrinhamento. Atrás do artesão ajoelhado e do trono real, os muros do palácio de Minos decorados com frisos pintados representando dançarinos e touros e as bordas com cachos de uva.

O Seis de Ouros é uma carta harmoniosa que reflete a renovação da fé que aqui acompanha a fuga bem-sucedida de Dédalo para Creta e o favorecimento da proteção do poderoso e rico rei Minos. Depois da catástrofe do Cinco de Ouros e suas implicações de perdas tanto de bens materiais quanto da confiança na vida e nas próprias habilidades, o Seis de Ouros promete uma recuperação proporcionada pela generosidade e pela caridade das pessoas.

O clima dessa carta não diz respeito a recompensas por trabalhos realizados, mas à benevolência. Às vezes, podemos contar com retribuições da própria vida, que nem sempre é cruel e que recompensa o indivíduo pelos seus grandes esforços.

Essa experiência da generosidade da vida surge do interior do próprio indivíduo e não da caridade de outras pessoas, pois descobrimos que é possível dar incondicionalmente, apesar dos nossos reveses e perdas.

Portanto, o significado mais profundo do Seis de Ouros toca em uma importante faceta da criação manifestada, porque nem tudo é consequência da vontade consciente ou do erro. As vezes, a boa sorte cruza o nosso caminho e, apesar de não podermos planejá-la ou esperá-la, geralmente ela sobre¬vêm no momento em que as nossas posses estão no mais baixo nível.

Dédalo não é uma pessoa totalmente ruim, apesar do crime que cometeu. Ele é um homem ambivalente, capaz de proporcionar tanto muitos benefícios quanto malefícios e, portanto, a vida não o julga da mesma forma que a sociedade o julgaria aqui representada pela ira dos atenienses. Ele sofreu por seu crime pela pobreza, pelo exílio e pela humilhação, e agora um novo ciclo se inicia, anunciado por um desses golpes de boa sorte que se apresenta na forma de bondade c de generosidade as nossas ou as dos outros.

No sentido divinatório, o Seis de Ouros prevê uma situação que promete dinheiro ou posses a ser compartilhados e dos quais o indivíduo será chamado a oferecer generosidade ou será objeto dela. E, assim, a fé na vida e na própria capacidade é readquirida.


O Hierofante
A carta do Hierofante retrata uma estranha figura: um Centauro, com o tronco, os braços e a cabeça de homem e o corpo de um cavalo. Seus longos cabelos e barba castanhos e seu rosto maduro e benigno sugerem um sacerdote ou um professor. Sua mão direita está levantada em um antigo sinal de bênção, enquanto a esquerda segura um pergaminho. Aos seus dois lados, uma coluna de pedra. Atrás dele é vista a rocha bruta da caverna que é tanto a sua morada como o seu templo. Uma luz é dirigida sobre a sua cabeça coroada por meio de uma abertura no teto da caverna.

Aqui encontramos Quiron, rei dos Centauros, curador, sacerdote e sábio educador de todos os jovens heróis da Mitologia. O próprio nascimento de Quiron foi um verdadeiro mistério, pois ele nasceu da união de Ixion, - filho do deus da guerra, Ares -, com uma nuvem que Zeus formou à semelhança de sua esposa Hera, para impedir que Ixion fizesse amor com a própria deusa.

O centauro foi educado por Apolo, o deus-Sol, e Ártemis, a deusa da Lua, e, graças à sua grande sabedoria e espiritualidade, ele foi eleito rei dos centauros, cuja tarefa era incutir nos jovens príncipes gregos os valores espiri­tuais e o respeito pela lei divina que eles deviam aprender antes mes­mo das artes de reinar e das proezas das armas.

Quiron também era um grande curador e conhecia o segredo das ervas e das plantas. Mas ele era incapaz de curar a si mesmo. Um dia, seu amigo Héracles visitou-o em sua caverna; o herói grego acabara de matar Hidra com as suas nove cabeças venenosas. Aci­dentalmente, Héracles arranhou o Centauro na coxa com uma de suas flechas que haviam sido embebidas no sangue do monstro. Esse sangue era puro veneno e todo o conhecimento que Quiron possuía não conseguiu fazer com que ele o extraísse da ferida. Como era imortal, ele não podia morrer e, assim, foi condenado a conviver com a dor, sacrificando a felicidade do mundo e dedicando-se a ensinar a sabedoria espiritual.

No sentido interior, Quiron, o Hierofante, é a nossa parte que invoca o espírito para poder compreender o que nos é exigido por Deus. Ele é o nosso educador espiritual interno, o sacerdote que estabelece uma ligação entre a consciência terrena e o conheci­mento intuitivo da lei de Deus. O mundo de Perséfone, a Sacerdoti­sa, é sombrio e fugaz, e não pode ser compreendido pelo intelecto, mas o mundo de Quiron pode ser elucidado e interpretado pela men­te.

A palavra antiga pontifex para sacerdote significa "fazedor de pontes", pois o papel do sacerdote, tanto dentro quanto fora de nós', é servir de pai espiritual, estabelecendo um relacionamento entre o homem e Deus e tornando clara a natureza das leis pelas quais de­vemos viver para estarmos em relação correta com o divino. As leis do Imperador, que incorporam o princípio do pai na Terra, dizem respeito ao comportamento correto no mundo.

Mas as leis do Hierofante se referem ao comportamento correto aos olhos de Deus. Entretanto, Quiron não simboliza qualquer sistema religioso ortodo­xo. Ele é uma criatura selvagem, meio homem e meio animal, e o seu templo não tem qualquer manipulação humana, porém, mais exa-tamente, é uma caverna em uma montanha.

Assim, a lei espiritual que ele transmite não é uma lei coletiva baseada em dogmas, mas sim, individual e somente pode ser percebida por meio do nosso sa­cerdote interior. Portanto, pessoas diferentes experimentam Deus de uma maneira diferente, e atingimos o nosso entendimento espiri­tual de acordo com o nosso entendimento particular do que "Deus" possa realmente significar.

A ferida de Quíron faz com que ele seja o Curador Ferido, aquele que, por meio de sua própria dor, pode compreender e apreciar a dor alheia e, portanto, pode enxergar muito além do que aqueles que estão cegamente satisfeitos. E então Quíron, o Hierofante, repre­senta a nossa parte ferida em que algum problema insolúvel ou uma limitação qualquer nos aprofunda e nos torna misericordiosos quan­do, ao contrário, seríamos meras superficialidades de bondade sem qualquer sentido real do que possa significar. O verdadeiro sacerdo­te está aberto à dor e aos desejos do mundo, porque, ele mesmo, sofre.

A imagem de Quíron nos liga ao valor das limitações insuperáveis ou das feridas dentro de nós que, apesar de causarem sofrimento na vida cotidiana, assim mesmo nos obrigam a questionar e a abrir o caminho para uma maior compreensão das leis superiores da vida. Esse paradoxo também é sugerido pelo próprio Centauro, pois, sen­do metade deus e metade cavalo, ele se utiliza tanto do instinto quan­to do espírito, além de conter uma dualidade que faz parte de nossa condição humana. O homem não é totalmente animal nem totalmen­te divino, mas uma mistura de ambos, e deve aprender a conviver com os dois. Dessa mescla, surge a sabedoria do Centauro, que par­ticipa tanto do conhecimento de Deus quanto do conhecimento da lei natural - Deus manifestando-se no mundo das formas.

No sentido divinatório, quando Quíron, o Hierofante, aparece em uma abertura de cartas, ele implica que o indivíduo começará a, ativamente, procurar respostas de nível filosófico. Isso pode ocorrer como o estudo de uma filosofia particular ou de um sistema de crença, ou ainda como o compromisso profundo de busca por um significado para a vida. O Hierofante pode aparecer na forma de um analista, de um psicoterapeuta, de um sacerdote ou de um mentor espiritual na vida exterior, para quem nos voltamos à procura de consolo e ajuda. O Louco, então, emerge de sua descoberta do Submundo e dos po­deres ocultos do subconsciente à procura de respostas para o enig­ma de si mesmo e para o significado de sua vida. Ao encontrar-se com o Hierofante, ele descobre a sua parte que pode começar a formular e a expressar uma filosofia pessoal e uma visão individual do espírito que o guiam ao deixar para trás a sua infância, preparando-se para enfrentar os desafios da vida.


O Dois de Paus
A carta Dois de Paus retrata o jovem Jasão em pé e pensativo diante da caverna do Centauro Quíron, antes de se dirigir ao encontro com seu tio para reivindicar a sua herança. Quíron é apenas visível na escuridão da caverna. Jasão veste uma túnica escarlate e segura duas tochas acesas nas mãos.

O Dois de Paus, como os Dois de todos os Arcanos Menores, polariza a energia primitiva do As e, aqui, essa polarização implica o aventureiro e a sua meta recem-estabelecida. O nervosismo e o poder ainda indefinidos do Ás começaram a aglutinar-se para formar uma visão particular, apesar de ainda não ser claro como essa visão ou meta poderá ser alcançada. Jasão nada sabia a respeito do Velocino de Ouro, mas agora ele já sabe, porque Quíron contou-lhe a sua história c do seu direito ao trono de Iolkos. Aqui, o sentimento de potencial cristalizou-se em algo definido, mesmo que a verdadeira aventura criativa do futuro de Jasão - a busca do Velocino de Ouro - somente tenha surgido depois que ele empreendeu o primeiro está­gio de sua jornada.

É assim que começam todos os empreendimentos: um pouco de cada vez. Uma ideia leva a outra e, muitas vezes, a primeira não é a derradeira, mas simplesmente um prelúdio. Entretanto, o prelúdio é suficiente para nos impulsionar para fora do santuário da caverna, cm razão do sentido de que poderíamos ter mais do que temos na realidade, ou sermos mais do que somos. A jornada de Jasão para Iolkos, o lugar de sua herança por direito, é entremeada de perigos, pois ele tem um inimigo que prazerosamente lhe tiraria a vida. Ele não pode prever o resultado nem tampouco se conseguirá ou fracas­sará em seu intento. Mas ele acredita em sua visão o suficiente para tentar e segura firmemente as tochas que simbolizam o fogo da ima­ginação. Do contrário, ele - ou nós - permaneceria tranquilo, mas para sempre reprimido cm sua caverna; seguro, mas nunca realizan­do os potenciais que são seus por direito; por outro lado, esses poten­ciais precisam de visão para que possam ser concretizados.

No sentido divinatório, o Dois de Paus anuncia a formulação de uma nova meta, ideia, objetivo ou projeto criativo. Essa nova ideia pode não ser a forma final do futuro, mas tem muito potencial e é suficientemente atrativa para incentivar o indivíduo a sair dos seus presentes limites, impulsionando-o para uma nova iniciativa. Aqui tudo depende da coragem de o indivíduo assumir a nova ideia e ter fé na­quela força criativa invisível que gerou a visão desse novo caminho.


As Cartas Persistentes

Algumas cartas selecionadas ao acaso neste dia, o do primeiro contato com cartas de tarô neste sentido, o de lê-las, seguem persistindo repetidamente em jogos atuais, um ano depois deste encontro. O que a cigana diria disso?



O Dez de Paus
A carta Dez de Paus retrata Jasão sentado diante dos destroços do navio Argo, totalmente exausto. Ele voltou vitorioso para Iolkos e está com um traje real vermelho e uma coroa dourada; aos seus pés, o Velocino de Ouro. Ele está curvado pelo peso das dez tochas flamejantes, distribuídas em suas costas e seus ombros.

O Dez de Paus retrata um estado de opressão. Jasão cumpriu o que havia planejado fazer, mas, ao final da história, ele é uma figura triste, sobrecarregada e esmagada pelas preocupações, enquanto o navio Argo, uma vez glorioso, o transportador de heróis, está em ruínas e apodrecendo.

A princípio é difícil entender por que essa lenda de visão e de feitos heróicos devesse culminar em uma ima­gem tão pesada e triste. Mas essa última carta do naipe de Paus revela algo importante a respeito da imaginação criativa: ela pode não funcionar mais quando fica presa sob o peso das responsabilida­des materiais.
Essa dura lição ocorre a muitas pessoas que se propõem a iniciar um negócio ou objetivam um sucesso criativo. Com o passar do tem­po e com o crescimento e a solidez do empreendimento, o espírito de aventura e o entusiasmo do começo parecem sumir. No processo de atingir a sua meta e recuperar o seu trono, Jasão deixou de valorizar os elementos imprevisíveis, como aqueles que Medeia personifica, e dessa maneira ele "se vendeu", esquecendo-se da ousadia e da de­senvoltura que primeiro o empurraram para a aventura. O poder volátil da imaginação não se deixa prender às formas pesadas c estru­turadas. Frequentemente, o tédio e a depressão acompanham a inte­gralidade de um trabalho criativo, pois, enquanto a tensão do esforço empenhado cm ideias criativas gera mais ideias, suas concretizações finais significam que a imaginação não pode mais se expressar livre­mente.

Portanto, a imaginação precisa de campos novos e o indivíduo que, como Jasão, se agarra às formas que construiu pode deparar-se com uma certa opressão e exaustão sem razões aparentes. Esse é o momento de abrir mão de alguma defesa e segurança para que a imaginação possa ser despertada com uma nova ideia, uma nova meta e uma nova aventura.

No sentido divinatório, o Dez de Paus sugere que o indivíduo está sobrecarregado e oprimido por ter assumido responsabilidades em demasia e além de sua capacidade de suportar. A imaginação foi sufocada pelas excessivas preocupações materiais e parte daquela jovem ousadia c disposição simplesmente se perdeu. E preciso re­nunciar a certas coisas para que o processo criativo possa ser reno­vado e um novo ciclo recomece.


O Cavaleiro de Paus
A carta do Cavaleiro de Paus retrata um exuberante jovem montado em um cavalo alado trajando uma túnica vermelha e uma armadura e um elmo dourados. Uma aljava de flechas em seu ombro e uma tocha flamejante em sua mão. O cavalo branco está voando enquanto embaixo, na terra, encontra-se um monstro que o jovem matou com uma flecha. O monstro tem cabeça de leão, corpo de carneiro e cauda de serpente.

Na carta do Cavaleiro de Paus, deparamo-nos com a volátil, mutá­vel e efervescente dimensão do elemento Fogo, que está em constante movimento e eternamente buscando novos desafios. Ele é encenado pela figura mitológica do herói Beierofonte, que domou o cavalo alado Pégaso, matou a monstruosa Quimera e, em seguida, foi arruinado por sua própria arrogância, que o levou a tentar voar para o Monte Olimpo, a morada dos deuses.

Beierofonte teve de fugir de Corinto, sua terra natal, por haver matado acidentalmente o seu próprio irmão Belero, e procurou santuá­rio na corte do rei Preto de Tirinto. Mas a esposa desse rei apaixonou-se pelo impetuoso e um tanto ambíguo rapaz e, ao ser rejeitada pelo jovem, o acusou diante do rei Preto de tentar seduzi-la. Acreditando na história da esposa, o rei decidiu destruí-lo.

Beierofonte foi então enviado em uma aparente missão fatal - a destruição da Quimera, um monstro que soprava fogo. Mas o jovem teve a sorte de ser ajudado por um adivinho que o instruiu cm como capturar e domar Pégaso. Beierofonte encontrou o cavalo e jogou sobre a sua cabeça uma rédea dourada que Atena lhe havia dado. Ele então venceu a Quimera voando sobre ela no dorso de Pégaso, enchendo-a de fle­chas e arremessando a sua lança, em cuja ponta havia colocado uma bola de chumbo, na boca do monstro; o fogo que a Quimera soprava derreteu o chumbo que, líquido, escorreu em sua garganta, matando-a.

Em vez de demonstrar a apropriada modéstia com respeito ao seu feito, Beierofonte tornou-se arrogante e prepotente. No auge de sua sorte, com presunção, tentou alcançar o Olimpo como se fosse imortal. Furioso, Zeus enviou uma vespa que picou Pégaso por baixo da cauda, fazendo-o empinar, desmontando Beierofonte, que despencou vergonhosamente para a terra.

Beierofonte, o Cavaleiro de Paus, é a imagem do desejo por novas e mais gloriosas aventuras. Essa figura ambivalente, muito criativa e desprendida da realidade, pois, apesar de ser a primeira a pressentir coisas novas, assim como a primeira a enfrentar um de­safio, por mais difícil que seja, também é a nossa tendência à presun­ção e a uma espécie de pretensão de que a boa sorte deva ser pro­porcionada pela vida, independentemente de quem sejamos ou do que façamos.
O Cavaleiro de Paus é um sedutor - as mulheres tendem a amá-lo, tal como a esposa do mitológico rei Preto -, mas ele não é confiável, pois nenhuma mulher consegue segurá-lo quando uma nova aventu­ra se apresenta. Ele é intuitivo c imaginativo, e, em termos moder­nos, poderíamos até chamá-lo de tendencioso, pois é o primeiro a assumir uma nova ideia, uma nova moda, um novo estilo de vida, bem antes de o restante da humanidade se conscientizar do valor dessa novidade.

O Cavaleiro de Paus não é um seguidor, como também não é um líder, pois é autocentrado demais e facilmente entediado para assu­mir a responsabilidade de dirigir outras pessoas. Como Dom Quixote do famoso épico de Cervantes, ele ataca moinhos de vento e assume causas ou desafios que podem não ser realmente relevantes, mas a respeito dos quais está preparado a fazer um enorme alarde só por­que parecem excitantes e o colocarão em destaque, como também o manterão ocupado durante um certo tempo.

O Cavaleiro de Paus é uma figura agradável e até adorável, e tendemos a perdoá-lo constantemente graças à sua natural positivi­dade, seu fascínio, sua ingenuidade e suas boas intenções. Mas, como dizem, o caminho para o inferno está cheio de boas intenções, e nem todas as intenções dessa figura são realmente concretizadas. Ele está constantemente engendrando novas ideias que podem ser filtradas, consideradas e processadas por meio de uma visão mais realista, seja pelo próprio indivíduo ou por outra pessoa mais em contato com a realidade do que esse fogoso e volátil Cavaleiro. Então, a sua força pode ser apreciada enquanto a sua fraqueza é tornada menos preju­dicial pela fria consideração dos fatos.

No sentido divinatório, quando o Cavaleiro de Paus aparece em uma abertura de cartas, ele anuncia que chegou o tempo para o indivíduo desenvolver as voláteis, exuberantes e aventurosas quali­dades incorporadas na figura de Belerofonte.

Muitas vezes, em nível divinatório, o Cavaleiro de Paus manifesta-se como uma mudança de residência, porque o indivíduo repentinamente se sente oprimido pelo ambiente no qual se encontra e sai à procura de campos mais amplos e verdes.

Algumas vezes o Cavaleiro de Paus penetra na vida das pessoas como um jovem encantador, interessante e um tan­to irresponsável, cheio de ideias novas e inspiradoras, mas que deve ser tratado com cuidado para que ele não nos leve a possíveis prejuí­zos. Se um desses indivíduos entrar em nossa esfera de relaciona­mentos, isso deve ser visto como um aviso de que essas qualidades estão tentando emergir de dentro de nós mesmos.


O Oito de Espadas
A carta Oito de Espadas retrata Orestes em uma postura de medo, com suas mãos levantadas tentando afastar o seu destino. Ele está cercado por um anel de oito espadas fincadas no chão. À sua esquerda, Apolo olha para ele de modo severo e zangado. À sua direita, as três Fúrias vestidas de preto, com rostos brancos e feios, e asas de morcego. Ao longe, nuvens ameaçadoras sobre picos nevados.

O Oito de Espadas retrata uma situação de servidão em função do medo. Diferentemente da paralisia apresentada pela carta Dois de Espadas, essa servidão envolve um total conhecimento da situa­ção e as prováveis consequências de qualquer escolha.

Aqui Ores­tes sabe muito bem o que acontecerá se assassinar a sua mãe ou se ele se recusar a fazê-lo, pois, qualquer que seja a sua escolha, sairá perdendo. Assim, ele fica paralisado tentando afastar de si o mo­mento da escolha. Apesar de as escolhas não serem geralmente tão sutis quanto as de Orestes, entretanto o Oito de Espadas reflete uma situação de indecisão paralisante. Parle do desconforto surge da per­cepção do indivíduo quanto à exata maneira de como chegou a essa situação, mas já é tarde para remorsos ou para retroceder.

Diferen­temente também da cegueira da carta Dois de Espadas, o Oito de Espadas retrata a consciência dolorosa de nossa parte na criação de toda a atual confusão. Esse é o momento anterior a difícil escolha, exacerbado pela realização desagradável de que nós mesmos a pro­vocamos.

Existem muitas situações típicas na vida, nas quais surgem a ser­vidão e a paralisia do Oito de Espadas. Urna das situações mais características é o problema do indivíduo que esteve manipulando duas pessoas uma contra a outra - uma esposa e um amante, um marido c um pai, dois amigos -, tentando adiar a decisão de uma escolha ou de um compromisso.

A tentativa de manter oculto o fato um do outro pode fazer com que a tomada de decisão possa ser mantida em aguardo durante um certo tempo, mas cedo ou tarde haverá uma confrontação e consequentemente o momento de cho­que, quando se descobre que esse subterfúgio somente piorou a si­tuação.

Desse modo, o Oito de Espadas surge naturalmente do Sete de Espadas, como se a astúcia e a sutileza, apesar de utilizadas por bons motivos e necessárias no momento, tivessem criado a própria armadilha. Então, devemos aceitar a responsabilidade por todo o ocor­rido, procurar compreender o que realmente desejamos e agir ime­diata e definitivamente. Dessa maneira, uma solução é possível.

No sentido divinatório, o Oito de Espadas anuncia uma situação pela qual o indivíduo é impossibilitado de agir por causa do medo das consequências. Uma tomada de decisão é necessária, mas qualquer que seja a escolha, provocará problemas. Existe a conscientização de que o dilema foi causado pelo próprio indivíduo, pois houve um longo passado de recusa, duplicidade, cegueira e medo da confronta­ção, muitas vezes para "evitar ferir" alguém, que sempre está presen­te no impasse. É importante enfrentar honestamente o nosso próprio envolvimento no problema.


O Ás de Ouros
A carta do Ás de Ouros retrata um homem moreno e forte com longos cabelos encaracolados e uma cauda de peixe, emergindo das profundezas do mar e erguendo um grande pentáculo dourado. Ao seu redor, rochedos ricamente recobertos de vinhas com cachos de uva amadurecendo. A distância, um cenário de verdes e férteis colinas rodeando uma baía.

Aqui nos deparamos com o deus Poseidon, o qual encontramos na carta da Torre dos Arcanos Maiores. Poseidon era um dos filhos de Cronos e Réa e participou do destino de seus irmãos e irmãs, sendo engolido pelo pai ao nascer. Mas a bebida que Zeus serviu a Cronos fez com que ele regurgitasse todos os filhos que havia engolido. Após a vitória sobre Cronos, a herança paterna foi dividida em três partes: Zeus tomou posse dos vastos céus; Hades, do sombrio Submundo; e Poseidon, dos mares, lagos, rios e de toda a superfície da Terra, visto que ela era apoiada sobre as suas águas e ele podia fazê-la tremer à vontade. Ele ficou famoso entre os deuses pelo seu anseio por terras e entrava em conflito com muitos deles por tentar apossar-se de ilhas e partes da costa da Grécia.

Poseidon era um deus da fertilidade, marido da grande Mãe-Terra e Senhor do Universo físico. Ele era chamado de "agitador da Terra" e venerado na forma de um touro, um grande animal preto com olhos flamejantes, que vivia nas entranhas da Terra; com suas pisoteadas ele fazia com que as montanhas se movessem e os mares inundassem a Terra. Portanto, Poseidon é uma das forças primitivas da natureza e, no Ás de Ouros, ele mostra o seu poder como o impulso de uma nova energia para a criação material.

Em contraste com o Ás de Paus, que se ergue como o nascimento de uma nova visão criativa, o Ás de Ouros volta a sua imensa potência criativa para a Terra, e essa emergente necessidade de concretizar c criar no mundo manifesto é aquela que dá suporte às nossas ambições materiais. O indivíduo que ambiciona riquezas e faz as coisas acontecerem em nível material experimenta algo do poder desse antigo deus terreno e o Ás de Ouros anuncia a erupção de uma nova ambição para a criação e o sucesso material.

No sentido divinatório, o Ás de Ouros prevê a possibilidade de uma realização material porque, agora, a energia primitiva para esse trabalho está disponível ao indivíduo. Muitas vezes dinheiro vêm na forma de uma herança ou de qualquer outra fonte, acompanhado da engenhosidade e da persistência em utilizar esses recursos efetiva e eficientemente.




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